Entrevista, parte II
A vida no colégio
Como já tinha referido antes, Conchita permaneceu no nosso colégio, uma temporada completa e mais o primeiro trimestre do ano seguinte. Bem poderia dizer que o curso de 1966-67 não foi de permanência completa, mas mais do que completa, isto porque durante as férias de verão, Conchita não as disfrutou em completo na sua casa de Garabandal, uma vez que ela preferiu passar um mês das suas férias no nosso colégio.
Conchita encontrou no nosso colégio o acolhimento e compreensão da minha parte. E isso fez-lhe sentir bem, pois desde o princípio das aparições que Conchita sofria muita incompreensão das pessoas mais próximas. Da mesma maneira que as meninas de Garabandal não lhes faltaram pessoas que acreditassem nelas, também nunca lhes faltou a cruz da incompreensão desde o seu início. Conchita fala disso mesmo no seu famoso diário que escreveu entre os anos de 1962 e 1963 e que é muito conhecido, porque este diário foi publicado. A primeira aparição do anjo teve lugar no Domingo, 18 de Junho de 1961, e neste diário pode ler-se o seguinte:
" Tinha chegado o dia 19. Quando nos levantamos, as pessoas já tinham começado a falar (...) Todos pensavam de forma diferente. Foi um dia que só se falava disso (...). No entanto, a maioria ria-se de nós. Estas conversas aconteceram às dez da manhã, quando íamos para a escola."
E tudo aquilo não era nada mais do que um leve princípio do que as esperavam: as sessões da comissão, as viagens ao Bispado de Santander, os interrogatórios...Todas as tardes, em horas possíveis para mim, vinha ter connosco e falávamos as duas. Nunca a obriguei a nada, ela vinha sempre de forma voluntária. Um padre claretiano, P. Joaquín María Alonso, que estava em Fátima a estudar o caso Lúcia por ordem da Congregação da Fé, veio ver-me mais de uma vez. Falou com a Madre geral e disse-me que tudo aquilo que falara com Conchita, o escrevera e que não iria destruir esses documentos até que passassem cem anos sobre o assunto
Para além do diário que eu escrevi na qual anotei todas as conversações que mantínhamos, aconselhei-a, como forma de desabafar interiormente, que escrevesse o seu diário no colégio. Assim o disse. Conservamos as suas duas agendas, que ao ir embora me ofereceu, sem que eu as solicitasse. Nesses escritos encontram-se expressões constantes como estas:
"Cada dia dou menos valor às coisas da terra, e peço a Maria por todos".
"Quero a Deus sobretudo".
"Ajuda-me, meu Deus, a fazer sempre a Tua vontade".
" Quero-te muito, Senhor"
"Que feliz fazia-me a Virgem ao vê-la!"
"Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espirito Santo, obrigado por me ajudares tanto!"
"Até ontem, nunca tinha pensado que a Virgem era filha de Adão e Eva. Isto faz-me pensar que é filha do meu pai e isso fez-me querê-la ainda mais. Daqui para a frente, a tenho por mãe, amiga e irmã..."
Eu tratava de formar a Conchita com toda a prudência, tratamos da oração, amor a Cristo, vontade de Deus, sobre a Eucaristia, respeito ao próximo, Fé, Confiança... Tudo consta no meu diário. Tive e tenho de Conchita uma opinião bem fundamentada e a quem nunca deixei de falar, por carta, telefone e estando com ela várias vezes em Fátima, onde ela tinha uma casa que recorria, sempre que as suas obrigações familiares o permitiam.
Depois de a ter conhecido durante todo este tempo, posso qualifica-la como uma mulher de grande personalidade, sem protagonismos, delicada, caritativa, humilde, com sentido de humor, e sempre em busca de cumprir com a vontade de Deus, obediente à Igreja. Todas estas características da sua personalidade, transmitias ao actual Santo Padre, numa carta recente que lhe enviei. Desde a fase que a conheci no colégio até agora, nunca deixei de comunicar-me com ela. Une-nos uma grande amizade. Em relação à sua docilidade perante a Igreja, recordo-me daquilo que me contou recentemente, uma amiga comum de Conchita. Disse-me que fez dois anos que esteve com Conchita em Fátima, a rezar o rosário pela noite, na parte exterior do Santuário, num sítio em que ela costuma estar, a uns trinta metros da Capelinha, de maneira que não havia ninguém ao seu redor. Como é sabido, entre dezena e dezena em Fátima costuma-se entoar uma canção religiosa e os fiéis estavam a cantá-la, esta pessoa disse a Conchita:
Conchita não dizes na Avé Maria "Mãe de Deus e mãe nossa" como costumam fazer os devotos de Garabandal.
- Não - disse ela, porque isso só se pode dizer em privado...
E esta pessoa comentava-me com uma certa dose de humor que ao ver que estavam separadas do resto dos fiéis e que portanto ninguém poderia escutar como rezavam as Ave Marias, nada mais do que elas as duas, pensou para si que por " privado", Conchita devia entender estar unicamente ela na sua casa e com as persianas fechadas... A estes extremos chega a delicadeza desta mulher, para nem sequer dar a entender entre as suas amigas mais próximas e sem querer adiantar-se ao juízo da Igreja em relação a Garabandal.
Regressemos ao colégio de Burgos. Conchita tratava bem as suas companheiras e era muito divertida. Recordo-me que estando na sua povoação, de férias, escreveu-me uma carta e quando a abri saiu de lá de dentro uma mariposa com uma mola, preparada para sair voando, coisas normais de meninas com vontade de brincar e divertir-se. Quando dissemos às suas companheiras quem era Conchita, apresentei-a quatro meninas sérias e formais para que a acompanhassem durante algum tempo fora do colégio. Duas delas ingressaram mais tarde na nossa congregação e uma delas destacada para as nossas missões em Africa, disse-me que devia a sua vocação religiosa a Conchita.
Quando chegou ao colégio, ela estava a passar por um momento difícil. As pessoas da comissão diocesana, apesar da sua boa vontade, não tinham a mínima psicologia para tratar uma menina, e dai derivaram boa parte das más interpretações, que tanto fizeram sofrer Conchita, a recordação das negações e as dúvidas, tão naturais em todos estes processos. Em relação a este ponto, não tenho nenhum inconveniente em transcrever literalmente o que escrevi no meu diário num desses dias, depois de ter falado com Conchita:
"Nenhuma de nós mentiu (...) Não é verdade que ensaiávamos. Como podem pensar isso? (...) Se voltar a ver a Virgem, ficaria muito triste pelas minhas negações (...) Desde o dia 15 de Agosto tive dúvidas. Via tudo como se tivesse tido um sonho que já tinha passado. Quando neguei, senti no meu profundo interior algo que não me deixa tranquila."
Em muitas conversações, foram algumas vezes em que Conchita se queixava da curiosidade que as pessoas tinham sobre o Aviso, o Milagre e o Castigo, sem que se preocupassem sobre as mensagens. Ela dizia-me que as pessoas fixavam-se demasiado no Milagre e os milagres em muitos casos não convertem pessoas, como sucedeu nos tempos de Jesus, com os fariseus.... Mas também falamos desses temas, do Aviso, do Milagre e do Castigo, mas não foi o que maior tempo dedicamos. Transcrevo algo que anotei no meu diário sobre o que Conchita falou a esse respeito:
"Sei em que vai consistir o Aviso, mas desconheço "quando". Virá directamente de Deus, quer dizer, não serão bombas atómicas, pois se fosse assim, isso viria dos homens. O Aviso, servirá de purificação. Se morrer alguém, será pela impressão que possa vir a ter com o Aviso. Será algo que se produzirá no céu. Nossa Senhora disse-me o nome, que não sei o que significa, é uma palavra que começa pela letra " a". Tenho que ir ver ao dicionário".
Assim com esta sinceridade, abria-me o seu coração e naquelas conversações encontrava a paz. Também fazíamos as duas, momentos de oração na nossa capela e quando já não havia ninguém, ajoelhávamos as duas diante do Sacrário. Ela encontrou tanta paz durante aqueles meses, que quando a sua mãe decidiu tirá-la do colégio, na despedida agarrou-se aos meus braços a chorar. Seguiu rumo ao hospital de Valdecilla de Santander, para realizar estudos de enfermaria, que tanta utilidade lhe deu para os seus primeiros momentos na ida para os Estados Unidos. Mas isso é outra história, que só conheço por referências.
3- Conchita e a Sagrada Eucaristia
Na mensagem de 18 de Outubro de 1961, Nossa Senhora pediu às meninas, e por extensão, a todos nós, que visitássemos com frequência o Santíssimo Sacramento. Desde o início das aparições até ao final, as manifestações eucarísticas de Garabandal foram muito numerosas..... Por fim, na mensagem de 18 de Junho de 1965, Conchita escutou a resposta do céu que dizia: " Cada vez é dada menos importância à Eucaristia".